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2°  Estudo de Caso

    No dia 30 de abril, no interior do Maranhão, 13 indígenas da etnia Gamela foram vítimas de ataques por fazendeiros e capatazes, dois deles tiveram suas mãos decepadas e cinco foram feridos por  armas de fogo. Pertenciam ao grupo participante da ocupação de uma área que é disputada com fazendeiros há cerca de 3 anos, os indígenas estavam desarmados. O ataque não representa um caso isolado, mas uma consequência da forma como a questão indígena vem sendo tratada no Brasil, com despreparo e desatenção por parte do Estado e incompreensão por parte da sociedade civil. A relação dos Gamela com a comunidade local se baseia em conflitos com relação às demarcações de terras, tópico já conhecido pela sua reincidência. Nesta mesma área onde se encontra a aldeia em Viana (MA), a Polícia Civil já registrou ao menos dois outros ataques aos Gamela, ocorridos em 2015 e 2016.

    Além dos ataques repercutidos recentemente, tramita no legislativo um Projeto de Emenda Constitucional (PEC 215) que daria ao Congresso o poder de demarcação das terras indígenas - tarefa antes incumbida à Presidência. Segundo o artigo 231 da Constituição, as terras indígenas são patrimônio público de uso especial. Neste território, somente estas comunidades podem fazer o usufruto das terras, rios e lagos. Sendo patrimônio público da União, o Estado brasileiro estaria imbuído da responsabilidade de demarcar tais extensões territoriais.

    Ao se falar em comunidade indígena, é de suma importância lembrarmos de que não se trata de "um povo", com a mesma origem territorial, a mesma língua, identidade e demandas sociais. Tal expressão promove um apagamento de identidades e de realidades, nos revela uma concepção universalizadora "do outro" e constrói um imaginário  sobre "quem são os indígenas brasileiros" como um povo só. Numa perspectiva sensível e realista, compreendemos que a "comunidade indígena brasileira" é constituída por vários povos, reunidos para e em torno de um mesmo fim, que é a luta por seus direitos e pelo reconhecimento de suas identidades. Nesse sentido, reconhecemos que cada um desses povos é originário de uma localidade, possui uma identidade, fala uma ou mais línguas locais, possui culturas tradicionais, dispõem de uma organização social e estrutural própria, entre outros aspectos que os definem e os distinguem entre si.

    O que se encontra atualmente, entretanto, é a convergência de decisões políticas que acarretam na violação aos direitos assegurados em constituição a essas comunidades. Para além da violência e das disputas territoriais, o presidente do órgão estatal responsável pelas políticas indigenistas (FUNAI) foi exonerado, ainda em abril, por não aceitar indicações exclusivamente políticas, de caráter contrário ao ideal da instituição, provenientes do Congresso. Já em maio, o Alto Comissariado da ONU para Direitos Humanos foi notificado sobre as atuais violações de direitos perpetradas sobre a comunidade indígena maranhense. Desde então, a organização internacional tem mostrado preocupação com a situação de abuso dos proprietários de terra e a insensibilidade de políticos e governadores a respeito da conjuntura em que os índios Gamela se encontram.

    Diante de tantas situações complexas advindas do próprio Estado e que, por vezes, violam os direitos humanos, como acima expostas, os povos indígenas brasileiros buscam se unir para construir e fortalecer sua resistência. Um exemplo disso é o engajamento político desses, que não pensam duas vezes antes de firmarem presença em votações da câmara que dizem respeito às pautas indígenas, conscientes de como funcionam as políticas nacionais e de que forma elas se desenrolam nas instâncias governamentais.

     Outro exemplo de medida de resistência e fortalecimento indígena é a Semana Indígena dos universitários da UnB, realizada anualmente e organizada pelos próprios estudantes indígenas. Neste ano ocorreu a sua terceira edição, onde foram tratados temas como: (i) ações afirmativas e fortalecimento do vestibular indígena; (ii) desafios de empoderamento econômico e social de mulheres indígenas; e (iii) genocídio e memória indígena. Em depoimento ao Umanitá, a estudante indígena, Núbia Batista, reafirmou a importância desse evento acadêmico como uma ação de resistência e de empoderamento dos estudantes indígenas: “Pra mim esse evento é de muita importância porque somos nós mesmos que o organizamos, que palestramos e que convidamos outros palestrantes, pra gente dizer da nossa presença e da nossa capacidade. E o importante é lutar pelos nossos direitos. Nesse ano eu participei da mesa sobre o empoderamento de mulheres indígenas e ficou marcado pra mim que o maior desafio é lutar pelos direitos já previstos na constituição[...]. O que mais nos move é que nós lutamos pelo nosso povo. É o povo a nossa marca, e essa marca está no cuidar… toda essa nossa luta é parte do empoderamento. Só de estarmos na universidade, já somos empoderados, mas com o foco de fortalecer nossa cultura.” Sem dúvida, alguns dos aspectos importantes e que caracterizam esse evento acadêmico como uma medida de resistência são o fato de, por um lado, ele ser pensado e construído pelos estudantes indígenas, o que viabiliza e assegura que a seleção de temas esteja ancorada nas necessidades das comunidades por eles representadas; e, por outro lado, ele ser realizado na Maloca, espaço indígena dentro da universidade.

 

Bibliografia

 

http://politica.estadao.com.br/noticias/geral,brasil-fracassou-em-proteger-terras-indigenas-diz-onu,70001760521

http://www.funai.gov.br/index.php/2014-02-07-13-26-02

https://www.cartacapital.com.br/sociedade/no-maranhao-barbarie-contra-os-indios-gamela

http://www.conectas.org/pt/acoes/politica-externa/noticia/47206-ataques-aos-indigenas

 

III Semana Indigena http://www.noticias.unb.br/component/agenda/agenda/855

Violações dos Direitos Indígenas no Brasil

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